quarta-feira, 16 de janeiro de 2019

Aproveitar o momento para superar a idiocracia.


A idiocracia não é o mesmo que a “democracia dos idiotas”, poderia ser pela forma como se manipulou a grande massa, porém, o que se tem foi o uso da democracia como meio de se chegar no poder institucional-estatal e instalado nele fazer valer seu “projeto” moral e financeiro de sociedade, usando a força  (redes sociais, discurso de ódio, militarismo, etc.) para impor um tipo de indivíduo “normal” normatizado, privatizado e controlado, e para isso precisa ser idiotizado.

Ainda vou escrever academicamente isso até a hora que a ideia me for expropriada.

Já faz um tempo que não escrevo e imagino que muitos esperavam minha ácida e babante crítica diante da desgraça eleita e empossada. Bom, tenho focado muito no twitter minhas breves posições.

O certo que já alertava para essa inclinação de parte da sociedade brasileira para o bolsolixismo e que os riscos estavam expostos para quem quisesse ver. Nunca desanimei, votei em Haddad nos dois turnos, mas fui formado para pensar e refletir, e os sinais não eram dos melhores. Nem adianta dizer: “eu avisei”.

Por isso, prefiro focar na reflexão do que devemos fazer nesse e no (possível) próximo momento. 

Tempos atrás escrevi sobre esse papel da democracia como um valor a ser consumido como algo necessário à vida. Entende-se por consumo, não pela lógica capitalista, mas ontológica como um valor produzido e reproduzido pelas relações sociais entre todxs nós.

Há vários artigos ou reflexões que sinalizam para o perigo de depositar única ou exclusivamente na democracia a possibilidade de bem estar aos “cidadãos”, ou condição para melhorar a vida dos indivíduos, assim como depositada parte das esperanças de 1988 com o desgaste político econômico da ditadura civil-militar.

E o ponto é esse: a democracia como alternativa pragmática. Isso representa tanto perigo para democracia, quanto para os seus defensores.

Dizer que “só na democracia” é possível ter liberdade de imprensa até vai. E ainda assim devemos considerar o poder de mando e influência do mercado.

Agora dizer aos trabalhadorxs que a democracia resolverá os “problemas de emprego, distribuição de renda e demais direitos de cidadania” parte de um pressuposto mentiroso e que pode respingar na própria democracia.

Vamos aos fatos e reflexões das duas décadas vividas com a ascensão eleitoral do lulismo (Singer, 2012) e seu programa político institucional implantado. O acesso à benefícios estatais individualizados como transferência de renda (Bolsa Família) e créditos diversos dialogam com ima fração da classe trabalhadora, contudo depositam no “eu” um direito que não coaguna com uma perspectiva coletiva. E nem a sua gestão poderia ser coletiva, já que expressa o apoio e o estímulo ao indivíduo.

Além da personificação dos programas estatais e institucionais na pessoa do chefe de governo, nesse caso o presidente da República. 

Elemento que na voz das oposições, classificou-se de “populismo”, independente do papel que estas políticas públicas desempenham na autonomia dos indivíduos que devem ser apoiados sim pelo Estado para haver um processo cíclico de cidadania operando.

Seria possível então construir essa ponte da conquista individual para coletiva? 

Possível sim. O atual cenário mostra duas coisas: 1) Há dois pesos e duas medidas na direção hegemônica da esquerda brasileira, algo entre “radicalizar fora das instituições” e fraquejar republicanamente no exercício do poder institucional; e 2) Essa extrema direita que hegemonizou o pensamento facista literalmente “caga e anda” para o que o Estado Brasileiro acumulou em termos de estrutura, políticas ou concepção geral (tampouco a universal) e tem atuado (com seus limites) numa reconfiguração de instrumentos e valores.

Sobre esse segundo item, de forma dramática, a extrema direita mostra que mudanças e transformações estruturais são polêmicas, mas não impossíveis de fazer e sem esperar a “maturidade da sociedade”, vai a fórceps. Mudanças como esta, na esquerda, alguns grupos de base chamavam de “fazer fazendo”, ou seja, mantém-se o debate, mas não se espera um “super planejamento estratégico” para fazer.

E se essas mudanças e transformações são necessárias e pari passo às medidas de estímulo individual, devemos entender que são essas reformas estruturais a raiz da defesa da democracia.

Quem vai valorizar mais verbas para ciência e tecnologia se as mesmas estão distantes do diálogo e da perspectiva da sociedade? E eu digo isso não pelo que as pessoas vão “ganhar” através do desenvolvimento científico, e sim pela ampliação dos debates e discussões sobre o seu papel e importância para sociedade.

Quem sabe tendo essa combinação democrático – estratégica, possamos ter a sabedoria popular apropriando-se da necessidade do investimento da ciência, apontando pequenos desafios para vida cotidiana como tapar um buraco na rua, resolver o problema do acesso à alguns serviços, etc., e n contrapartida poder via democracia incorporar esses interesses pequenos, médios e grandes.
Posso estar repetindo a lógica deliberativa em Habermas, que dentre as suas correntes apoia-se na discussão do processo participativo-deliberativo. Ou seja, nada de novo.

O novo seria implantar esse processo como estratégia estruturante de Estado. O “fazer fazendo” resolvendo pequenos problemas institucionais de interesse público, envolvendo não pela necessidade, mas pelo interesse individual-coletivo.

Penso que o momento é de indignação e resistência. Porém, não vamos esquecer que por um tempo, nós na esquerda também dissemos: “vão ter que nos engolir”. Nossa chance e os problemas, limites, dificuldades e conquistas desse projeto já passaram, até o momento.

A questão agora é como enfrentar de pé o governo de extrema-direita fascista de Bolsolixo e ao mesmo tempo construir as bases de um projeto que tenha desde o primeiro dia de oportunidade a ousadia de implantar sem medo de ser feliz.