sábado, 2 de janeiro de 2021

Disputa de projeto societário versus normalidade institucional. As eleições para as mesas nas Câmaras de vereadores/as no Brasil.

 




Já havia escrito aqui neste blog sobre "Pra que governar?"(https://wagnerhosokawa.blogspot.com/2020/08/o-fim-da-esquerda-liberal-derrota-da.html) diante da pilhagem de quase três décadas de governos do PSDB em São Paulo que deixariam a máquina do Estado enfraquecida e tornando o gabinete do governador em mero gerente de contratos. Agora, em 2021, a postura das esquerdas na composição dos legislativos municipais evidencia que adaptar é melhor que resistir. 

Da postura da bancada do PT na cidade de São Paulo ou do Psol em Belém do Pará, sendo que a primeira é pela sobrevivência política e a segunda pela governabilidade, temos muito a pensar sobre o papel dos instrumentos políticos da esquerda.

Antes que algum companheiro, esquerdista, lulotiête ou qualquer denominação assim venha a rosnar, quero lembrar que já vivi debates intensos na direção do partido (PT) de Guarulhos sobre sucessão na presidência do legislativo municipal, quando ainda quando o assunto era parte da responsabilidade coletiva e militante de disputa da sociedade. Ou seja, a sociedade e em especial o conjunto da classe trabalhadora era o centro das nossas preocupações quando o assunto era posição política. Agora tudo é vago, pois convêm. 

Primeiro um panorama de como foram as sucessões nas presidências dos legislativos: vamos começar pela minha cidade né, Guarulhos (SP) que teve chapa única para presidência e a mesa diretora tendo a frente um político tradicional, da direita corrupta e conhecido pelo jeito "carinhoso" de lidar com divergências, dono da principal pedreira e empreiteira local que serve a administração municipal a anos na cidade, ele Martello é a representação de um passado de desmandos e caos em Guarulhos em especial nas décadas de 1980 e 1990, fase do coronelismo em Guarulhos, o mesmo já passou pelo PPB (hoje PP) malufista e que era combatido inclusive por setores da sociedade civil e da centro direita de Guarulhos. Na votação ontem, 29 x 05 definiram a "vitória" da chapa "legislativo forte" (parece piada) para conduzir os trabalhos no parlamento local para o próximo período. Das cinco abstenções estão o Psol e divergentes da base do governo. E o que é interessante, a bancada do PT compôs a chapa e fechou questão no bloco "vitorioso". Ok, o passado não importa. Mas isso quando o seu adversário ou inimigo muda, o que não é o caso.

Na capital paulista o PT de São Paulo na mesma lógica se curva ao conhecido corrupto Milton Leite. Em votação unânime e também garantindo uma vaguinha na mesa diretora, deu cheque em branco para uma das figuras mais icônicas do entreguismo, oportunismo e mutretas da cidade de São Paulo, com divergência da bancada do Psol que apresentou candidatura alternativa e demarca como será a oposição a Covas.

E de São Paulo vamos para Belém do Pará, onde Zeca Pirão do MDB venceu com unanimidade o pleito, fazendo Psol e PT na mesa diretora. (FONTE: https://www.oliberal.com/politica/zeca-pirao-e-eleito-presidente-da-nova-mesa-diretora-na-camara-de-belem-1.341502) A governabilidade atua dentro dos padrões de um discurso sobre o "respeito as diferenças regionais", OK, mas onde ficam os valores universais? No fim, são apenas discursos que fazemos nos palanques, tudo segue o roteiro da Realpolitik  e os seus protocolos da ordem. 

Isso tudo mostra como será a prévia do que será a sucessão da Câmara dos Deputados/as e do Senado que seguirá a risca a ideia do "menos pior", onde de um lado está Arthur Lira (PP/AL) apoiado pelo bolsonarismo e Baleia Rossi (MDB/SP) pelo bloco liderado por Maia (DEM/SP), e já teve adesão da bancada do PT que negocia uma vaga na mesa diretora. 

Recentemente o militante Breno Altman tem sido uma voz solitária sobre o tema e apresentando suas razões para se posicionar pela disputa pela esquerda nas duas casas do Congresso Nacional, entre as justificativas estão a construção de unidade programática e firmar uma posição firme contra o bolsonarismo. (leiam em: https://operamundi.uol.com.br/opiniao/67903/a-falsa-escolha-de-sofia)

Entre os críticos está parte da classe assalariada média que vive envolvida pelos ideais liberais republicanos de que um dia alcançaremos a justiça social através de uma catarse abobada em que vamos nos dar as mãos e por magica a burguesia financeira irá ceder diante dos rostos felizes dos povos. Bom, eu não creio nessa babaquice, e se de mundo real que precisam, basta ver o processo de erosão da constituição de 1988 no período de 2016 a 2020, onde a burguesia governa desde o governo Collor por meio dos Projetos de Lei de Emenda a Constituição fracionando, destruindo e pilhando direitos por meio de medidas legais. Vamos contar quantas emendas a constituição a esquerda aprovou em favor da classe trabalhadora desde 1990? Nenhuma. Ah, e a lei da ficha limpa não conta, isso venho de forças progressistas com apoio da centro direita da Igreja Católica numa tentativa patética de combater corrupção colocando freios na democracia. Vamos lembrar que as brechas ajudaram inúmeros candidatos/as que se elegeram, exerceram mandatos, fizeram merda, retornaram, se candidataram e se elegeram...etc, etc., etc.

Há uma condição política de uma fração da classe assalariada média que flertar com as pautas da esquerda, mas que gosta de manter seu lugar de privilégios, atuando como opinião pública isentona, não se envolve nos processos de luta, prefere manifestações virtuais e reivindica um republicanismo liberal que foi abandonado já na ditadura de Luís Bonaparte (Leiam "O 18 Brumário de Luís Bonaparte", em Marx) e que em termos objetivos só condicionam o sistema e degradam as condições da classe trabalhadora. Aqui eu identifico o forte lugar de fala (quase monopólico) 

Sobre a atual situação: O que ter vaga numa mesa diretora pode significar? Bom, para o ocupante da cadeira temos a linha de sucessão, ou seja, no impedimento do titular e do vice, o presidente de qualquer parlamento ocupa provisoriamente o cargo de chefe do executivo. 

O que não é o caso. E na atual situação, ocupar vagas na mesa diretora? Isso amplia em assessoria e recursos na casa, e o membro ganha mais evidência em termos de exposição na mídia, mas não tem poder sobre a pauta, já que essa é prerrogativa do presidente e/ ou do colégio de lideres partidários. 

Historicamente para esquerda não fedeu nem cheirou.    

Aí você poderia me contestar. "Se não fede nem cheira, porque se preocupar?", simples, pela política estúpido!

Sim, por uma questão que tem valor para nós (esquerda) e não tem o menor valor para eles (representantes políticos da burguesia).

Outra coisa, posição que pode se estender para o futuro. Ou seja, uma vez que há alinhamentos de bancada, ainda mais numa composição pragmática, a tendência é ser cobrado por isso ao longo do mandato, até que haja uma situação limite em que ou se toma posição de rompimento ou se entrega de vez ao jogo parlamentar burguês. (A história é rica de exemplos, bora você ter o trabalho de pesquisar também) 

E as comissões? Bom no legislativo compor comissões é fundamental para se apropriar de certo poder no parecer de projetos de lei e outras medidas, mas historicamente para esquerda é um lugar também de marcar posição, já que temos situações como do final do ano guarulhense em que em menos de 48 horas o prefeito reeleito do PSD de Kassab enviou dois projetos de lei com pareceres relâmpagos destas comissões que tratam da privatização dos serviços de manutenção e construção na educação municipal (parceria público vaso sanitária/ privada)  e  extinção da empresa pública de serviços e obras municipais (Proguaru), nesses dois casos o parecer das comissões deixaria o personagem The Flash para trás. 

A esquerda parlamentar precisa fazer o que faz desde o século XIX ocupar o parlamento como lugar de denúncia e organização da classe trabalhadora, e mesmo longe dessas "facilidades" tem sido determinante para resistência nos Parlamentos. 

Num artigo recente (https://wagnerhosokawa.blogspot.com/2020/12/afasta-de-mim-esse-lula.html) citei a questão da "renovação" do PT e insisto na tese que no período de 2003 a 2010 perdemos a grande chance de construir uma unidade limitada interna para progressivamente renovar os quadros no parlamento, cirando a possibilidade de eleger, mesmo em cotas, setores da juventude, mulheres, negros/as e LGBTQI+, construir um amplo processo de ampliação no parlamento e fortalecer as esquerdas mesmo que num programa mínimo. Isso não foi feito e nem pensado. Mas ainda há tempo.

No final, é certo observarmos quem cobra de quem na relação com o PT. É um partido grande e expressivo, e no parlamento é sempre cobrado a assumir posturas de bancada parlamentar adequada e adaptada a ordem. Cobranças que vem dos intelectos da direita. Já que os laços coletivos e de classe foram rompidos, o que vale agora é o tratamento dado nesse processo de sucessão das casas legislativas: tratar com menor grau posições que podem desconstruir a ideia do porque é necessária a esquerda no parlamento. 

Cabe o partido, inclusive no parlamento levar a reflexão das massas e não o seu contrário. essa questão da opinião pública tem corroído os cérebros dos dirigentes, que preferem ser guiados pela idiotice geral em vez de serem eles parte dos educadores/as da classe trabalhadora. Leiam Gramsci!

Sobre o Psol e o caso de Belém, que não é o primeiro no caso das alianças momentâneas. Só Edmilson poderá provar que recuos no parlamento podem ser benéficos a classe trabalhadora, desde que acompanhadas paralelamente de uma estratégia que envolve ampliar a massa para um projeto de esquerda que resulte na ampliação da esquerda na sociedade civil e na sociedade política, e construir resistências ao modelo de Estado neoliberal traduzindo isso na relação com a categoria dos servidores públicos e do conjunto da sociedade.

No momento, nenhum movimento da esquerda brasileira que governou o Poder Executivo pode dar esse exemplo, o que tivemos é a velha forma de casuísmo e governabilidade dando em saldo zero para esquerda. 

Bom, vamos ver o que será. 

Depois de um período na governabilidade do legislativo, me contêm daqui dois anos no que avançamos ao entregar votos para corruptos de estimação.

Outra coisa, aguardo ansiosamente as notas de justificativa das bancadas em Guarulhos e em São Paulo. Ainda estou filiado, mereço essa consideração ainda.