sábado, 7 de abril de 2018

Reproduzindo: Editorial | A história está só começando I Editorial Jornal Brasil de Fato

LUTA

Editorial | A história está só começando

Não é a primeira vez que o Brasil se vê em um cerco provocado por forças conservadoras

Brasil de Fato | Belo Horizonte (MG)
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"Em todas as situações anteriores, o povo não teve outra saída senão se organizar e construir saídas coletivas para superar a realidade" / Ricardo Stuckert
Mais um ataque à democracia brasileira. É isso que significa a prisão do ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva, votado na quarta (4) pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Um julgamento que segue com o objetivo do golpe que destituiu Dilma Rousseff a fim de recolocar (e manter) forças conservadoras, elitistas e anti-povo à frente do governo do Brasil.
Como resultado até agora, foram dois anos de corte de investimentos, de direitos trabalhistas destruídos e a da Constituição estraçalhada. E o povo brasileiro sofre com isso na pele: o custo de vida está mais alto, o desemprego batendo recordes, as contas no fim do mês não fecham… A vida realmente piorou para quem depende só do seu trabalho para sobreviver.
O cerco parece se fechar cada dia mais quando se olha ao redor e vê assassinatos políticos e perseguições, quando se vê milicos velhos e impunes fazerem ameaças públicas de intervenção, caso a decisão do STF fosse a favor do ex-presidente.
A realidade é dura mesmo e o sentimento de impotência tende a prevalecer. O que fazer diante disso tudo? É uma pergunta que vem logo à cabeça, sobretudo daqueles que já entenderam que vivemos em uma sociedade de classes, em que poucas famílias – donas de empresas e bancos – se beneficiam do trabalho de milhões.
É importante destacar que não é a primeira vez que o Brasil se vê em um cerco provocado por forças conservadoras. Para citar a história recente, foi assim na ditadura e nos anos 1990 com FHC. Em todas as situações, o povo não teve outra saída senão se organizar e construir saídas coletivas para superar a realidade. Muita gente se lembra das Diretas Já, nos anos 1980, e das marchas gigantes que cortaram o país em 1997, por um projeto popular para o Brasil.
A ideia de que “juntos somos mais fortes” tem que ser fortalecida neste momento. O Congresso do Povo, organizado pela Frente Brasil Popular, é uma boa oportunidade para isso, uma vez que tem a proposta de construir coletivos em cada cidade do Brasil, nos bairros, na periferia, na roça. Coletivos que terão a missão de levantar os reais problemas que as pessoas vivenciam em seu dia-a-dia. É também um espaço de estudo, de encontro, de achar esperança no olhar do outro, de ver na angústia uma possibilidade de superação.
A esperança não vem do além. Ela surge quando há um projeto de um país melhor. A tarefa é construir esse projeto. Que o Congresso do Povo, que acontece em julho deste ano, seja grande e capaz de apontar uma saída que vá para além das eleições. A história brasileira, contada pelos trabalhadores, ainda está só começando. Ainda tem muita luta pela frente.
Edição: Joana Tavares
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São Bernardo, 1978-2018
Lulismo não morre com a condenação do ex-torneiro mecânico, mas terá que se reinventar

Opinião de André Singer (FSP 06/04/2018)avsinger@usp.br

No dia 12 de maio de 1978 começava a greve da Scania-Vabis em São Bernardo do Campo. Era a primeira paralisação operária desde 1968 e o sucesso dos trabalhadores do setor automobilístico mudaria a história do país. A presença de Luiz Inácio Lula da Silva, o líder sindical que emergiu daquele movimento, por 24 horas no Sindicato dos Metalúrgicos depois de decretada a sua prisão na última quinta (5), fecha simbolicamente o longo ciclo iniciado então.

O lulismo não morre com a condenação do ex-torneiro mecânico. Mas terá que se reinventar para sobreviver sem a liberdade daquele em torno do qual o movimento cresceu ao ponto de chegar à Presidência da República. A despeito de quaisquer outras considerações, Lula demonstrou, durante esses 40 anos, a inegável capacidade de aglutinar o campo popular da política brasileira em torno de si.

Operação Lava Jato, que alcança seu ápice com a ordem de aprisionamento do ex-mandatário, conseguiu o efeito objetivo de afetar o coração da alternativa popular. 
O juiz Sergio Moro, mais uma vez mostrando que age olhando para a política, apressou-se a executar a sentença antes que pudesse haver algum recuo superior. 

A profunda divisão do  STF (Supremo Tribunal Federal) a respeito, demonstrada na votação do habeas corpus, indicava a instabilidade da decisão anti-Lula tomada quarta (4).

Mas a Lava Jato, independentemente das intenções de cada um de seus membros, é apenas a ponta de um iceberg. 

Quando, na véspera da sessão do STF, o comandante Eduardo Villas Bôas divulgou duas postagens no Twitter e em uma delas escreveu que “o Exército Brasileiro julga compartilhar o anseio de todos os cidadãos de bem de repúdio à impunidade”, ficou claro que a prisão de Lula tinha se tornado, para determinados setores da sociedade, um assunto de “segurança nacional”.

As “intervenções pretorianas”, conforme as qualificou o ministro Celso de Mello, aproximaram um pouco a situação atual daquela vivida depois de 1964. 

Trata-se, mais uma vez, de impedir, no tapetão, que haja verdadeira alternância no poder. Uma disputa sem Lula candidato, e com dificuldade para explicar ao seu eleitorado quem o representa, esvaziará o pleito de outubro. A possível vitória de um candidato de “centro”, na realidade do campo da classe média, nessas circunstâncias, terá a sua legitimidade diminuída.

Por outro lado, a evolução dos acontecimentos poderá transformar a condenação de Lula no principal assunto da própria eleição. Dependerá, então, da capacidade dos dirigentes forjados neste ciclo, que permanecem em liberdade, reconstruir o polo que representa os pobres. Sobre o seu sucesso, o futuro dirá.