sábado, 20 de março de 2021

Tentações autoritárias: Bolsonaro vai declarar "Estado de Sítio"?

 



2021, março completa um ano da guerra contra Covid - 19 e de forma triste alcançamos o pior momento da pandemia com 35 mil óbitos (ver em: https://noticias.uol.com.br/saude/ultimas-noticias/redacao/2021/03/19/marco-mes-mais-mortal-coronavirus.htm) e o Estado Brasileiro mostra duas situações que advém da transição do período pós ditatorial e a Constituição de 1988, sendo está a primeira carta constitucional que estabelece a cidadania brasileira como compromisso do Estado e da sociedade, ou seja, 488 anos depois da invasão das nossas terras pelo reinado português, império, independência comprada, república por meio de golpe militar, enfim, a cidadania ora uma ideia de origem liberal nunca foi de fato um ideal das nossas burguesias.

Clovis Moura, intelectual brasileiro, faz um resumo preciso que responde como as elites brasileiras pensam a sua acumulação de riqueza, suas reflexões dividem esse processo em duas grandes fases, sendo a primeira escravocrata até 1888 e a República em 1889 se apoiando no capitalismo dependente (Florestan Fernandes), isso não é reducionismo, é um projeto. Sendo projeto de uma determinada classe dominante a sua interrupção ou mudança se daria por meio dos movimentos da base social que a sustenta ou que a ela se submete.

A história brasileira e seus historiadores/as a tempos concordam que a historicidade da relação entre as classes dominantes e dominadas foi de extrema repressão, onde qualquer questionamento a ordem estabelecida foi tratada com profunda violência, distante da idealização do "brasileiro cordial" de Sergio Buarque de Holanda para um tipo de "brasileiro subserviente, oprimido" num país onde a questão social era um "caso de polícia" como marco da República Velha e desde então a vida republicana nacional segue mais os ditames da acumulação de riqueza para classe dominante e menos, muito menos, ideais liberais de democracia, Estado de Direitos, fortalecimento de instituições, etc., isso diz muito sobre como as relações sociais foram se constituindo, uma desorganização organizada.

Bolsonaro é a expressão dos interesses dessa classe dominante com um componente adicional que é o fascismo verde amarelo. O fascismo brasileiro não é novo, Plinio Sampaio tentou na década de 1930-1940 por meio do movimento Integralista, Vargas flertou com a Alemanha nazista e os ditadores militares de 1964 compôs com o Plano Condor na especialização e interação entre as ditaduras militares na América do Sul com supervisão dos órgãos do governo dos EUA. 

Os interesses direitos e ocultos se confundem e se fundem nessa conjuntura internacional e nacional. O pretexto da guerra fria era o conflito entre países capitalistas e socialistas, mas o Consenso de Washington reestabelece uma velha-nova ordem mundial do capitalismo, e o capitalismo dirigido pelo EUA se torna uma grande corporação que coloca alguns de seus órgãos a serviço da ampliação de mercados, como um plano de guerra para se apropriar das riquezas nacionais em nome da sua expansão. 

Há informações públicas sobre a avaliação e interferência da diplomacia estadunidense no impeachment da presidente Dilma (ver em: https://www.cartacapital.com.br/mundo/governo-biden-deve-revelar-papel-dos-eua-no-impeachment-de-dilma-diz-economista/), onde tais interesses se regula pela nova acumulação capitalista por meio do rentismo financeiro, erosão do processo de acumulação produtiva do capital, erodindo empregos e renda, reformas estruturais que retiram direitos trabalhistas, redução do orçamento público das políticas sociais e de proteção social, drenagem de recursos do Fundo Público para o interesse do setor privado sem nenhuma contrapartida à sociedade brasileira, da qual inclusive foi retirada dela.

2016 a 2021, entre Temer e Bolsonaro a regressão de direitos e a concepção do neoliberalismo do "cada um por si e o mercado por todos" tem guiado as reformas trabalhista e previdenciária, cujos efeitos serão sentidos progressivamente para sociedade brasileira. 

A pandemia causada pela Covid-19 colocou a humanidade em estado de atenção e emergência, onde o que era frágil se evidenciou, e falo justamente do Estado Brasileiro. A intencional não implantação dos instrumentos que fortaleciam a máquina estatal, a Seguridade Social, taxação de grandes fortunas, enfim todas que estão previstos na Constituição de 1988 fragilizaram as suas instituições onde a quase única questão que foi resolvida de fato foi a preservação de privilégios internos pelas forças políticas dominantes que a compõem.

Das fragilidades? A não implantação efetiva do SUS (Sistema Único da Saúde) nessa conjuntura com o aprofundamento das privatizações e terceirizações ao longo dos anos precarizou sensivelmente os serviços e seus trabalhadores/as, mesmo não abalando algumas conquistas como o Plano de Imunização, desde que se constituíam estoques de vacinas, o atendimento por meio dos programas à pacientes específicos e públicos excluídos deliberadamente da saúde complementar privada, porém, a rede de urgência e emergência onde os custos são altos e o retorno é certo na relação com os recursos públicos. Isso foi agravado na pandemia, e informações não faltam sobre isso na grande imprensa. (ver: (1) https://medicinasa.com.br/corrupcao-na-saude/ (2) https://noticias.uol.com.br/saude/ultimas-noticias/reuters/2020/09/25/respiradores-que-nunca-chegaram-como-corrupcao-dificultou-combate-a-covid-no-pais.htm)

A postura do sr. Bolsonaro na presidência buscando afagar sua base de apoio negacionista, autoritária e fascista tem sido o tom desde o inicio da pandemia, com quatro trocas de comando do Ministério da Saúde em menos de um ano e durante a pandemia, é incrível como os liberais de plantão e que gostam de "cagar suas regras" sobre o público exaltando a gestão privada, agora se calam. Todos/as sabemos o que uma mudança de gestão causa no processo de trabalho.

As tentações autoritárias do sr. Jair agora começam a se estabelecer após dois anos completos de governo com uma mudança significativa no jogo eleitoral de 2022, onde a decisão que coloca sobre suspeita as condenações do ex-presidente Lula e restabelecendo seus direitos políticos o insere na disputa eleitoral para presidência. Ânimos mudando, com sinalização de Doria em pensar concorrer reeleição para o governo do estado de São Paulo e as divergências internas no PSDB com falas divergentes entre o presidente do partido que rechaça Lula e FHC que daria voto útil no mesmo, o Centrão reavaliando possibilidades minando candidaturas de Hulk, Ciro, entre outros, e mexendo com os ânimos da direção bolsonarista. 

Jair foi deputado federal, é parte do sistema, é do establishment e entre seus ideais e o dinheiro, fica com o dinheiro. Jair está mais para Hermann Göring (ver: https://pt.wikipedia.org/wiki/Hermann_G%C3%B6ring) do que para Hitler, ou seja, prefere reunir riquezas individuais, e sinaliza isso ao falar de garantir vacinação após um ano de pandemia. Conhece os caminhos e interesses das forças políticas que apoiadas pela classe dominante, da qual faz parte, e busca articular seu governo num pragmatismo ainda mais tradicional.

Se for isso, por que o debate do "Estado de Sítio"? Usando a retórica da critica ao lockdown praticado pelos estados na busca por conter o avanço da Covid-19 devido ao atraso e a lentidão do processo de vacinação, arriscou dizer que tal medida era uma forma de "Estado de Sítio" localizada e que seria uma prerrogativa presidencial, isso levantou questões em todas as instituições, seja Congresso, STF, OAB entre outras. 

O que é o Estado de Sítio? Segundo a Constituição:


"Art. 137

Título V - Da Defesa do Estado e das Instituições Democráticas; Capítulo I- Do Estado de Defesa e do Estado de Sítio; Seção II - Do Estado de Sítio: Art. 137. O Presidente da República pode, ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional, solicitar ao Congresso Nacional autorização para decretar o estado de sítio nos casos de:

I - comoção grave de repercussão nacional ou ocorrência de fatos que comprovem a ineficácia de medida tomada durante o estado de defesa;

II - declaração de estado de guerra ou resposta a agressão armada estrangeira.

Parágrafo único. O Presidente da República, ao solicitar autorização para decretar o estado de sítio ou sua prorrogação, relatará os motivos determinantes do pedido, devendo o Congresso Nacional decidir por maioria absoluta." (C.F. 1988)

Se apegando no item "I - comoção grave de repercussão nacional ou ocorrência de fatos que comprovem a ineficácia de medida tomada durante o estado de defesa;", fez como sempre faz, "levanta a bola e joga pra massa", esperando algum apoio ou legitimidade. Após um ano de pandemia e a perda de mais de 290mil vidas querer aplicar uma medida que não tem haver com a politica de saúde é uma canalhice, já que medidas como fechamento de aeroportos e maior controle da circulação de pessoas é prerrogativa do "estado de emergência".

Blefe ou "vai que cola"? Já havia tratado esse assunto em outro artigo, sobre as cortinas de fumaça do sr. Jair, e isso é parte do seu método de governar, pode ser que ele mesmo espera a oportunidade, contudo várias duvidas no ar: 

- O Estado de Sítio poderá ser aplicado em pacto acordado entre Executivo, Legislativo e Judiciário? E se for, há quem confie na palavra de Jair? 

- Os militares irão num possível Estado de Sítio escamotear Jair?

- Ele terá peito para enviar o pedido ao Congresso caso lhe pareça favorável junto a sua base de apoio?

- Vai jogar para galera como faz até quando? E o que isso representa na sua estratégia negacionista e genocida com relação ao atraso na compra de vacinas? 

E no final, voltando a questão da saúde e da pandemia, Estado de Sítio servirá do que? Declarar guerra contra alguma empresa farmacêutica? Encampar hospitais privados para ceder leitos de caráter universal? Abrir a economia com apoio das forças armadas? Para enfrentar a Covid-19 o Estado de Sítio não tem função social nenhuma. Apenas para dar um certo gosto de ditadura aos seus apoiadores.


domingo, 14 de março de 2021

Pior momento para um militante permanecer em crise individual.

 




Na adolescência quando você é incluído em um lugar que faz sentido e lhe dá identidade, você se entrega de corpo e alma (literalmente). Peço licença para você, leitor e leitora, desse blog para compartilhar algumas inquietações particulares.


Na escola de militância política que eu me inseri os valores humanos e a luta por esses valores eram defendidos com fervor. Poucas eram as questões particulares, pessoais ou individuais que eu levava para o cenário das lutas, coletivos, movimentos, partido ou qualquer outro espaço da política. Era assim que eu era.

Então não passei pela fase da adolescência onde o indivíduo da classe assalariada média era diagnosticado com problemas de saúde mental que fazem sucesso hoje no controle do ser. TDHA e outros não eram problemas cognitivos na época, as vezes era um problema de "rebeldia juvenil". Para mim, militante do movimento estudantil secundarista, os limites eram mesmo fruto do sistema seja a defasagem escolar, o desestímulo a leitura, o ódio ou indiferença de algumas disciplinas, enfim, tudo era componente de um sistema em que o capitalismo determinava o grau da nossa ignorância.

Eu ainda tenho certeza de parte dessa reflexão, já que a sociedade e o Estado não mudaram dos meus quinze anos de idade pra cá. E o neoliberalismo com sua retórica de liberdade ao mercado e exploração da nossa força de trabalho seguem com sadismo e anestesia geral da população.

Mas a gente vai amadurecendo, tomando sempre cuidado para não apodrecer nesse processo. E isso é muito bom, viver a materialidade da suas concepções filosóficas, sociológicas e ideológicas acontecendo na sua vida. A dialética opera em nós. É foda.


Eu havia dito em algum dessas “prosas" no blog que estava passando, pessoal e individualmente, por um momento de transição. E por incrível que pareça não fiz ainda a travessia necessária.

Alguns conhecidos já devem estar de “saco cheio" das minhas reclamações e da minha caminhada nessa transição que teve início no final de 2014 segue ainda sem fim.

E o que eu posso dizer? Não deu ainda! Entre traumas, ex-amigos/as e ex-companheiros/as, rompimentos com coletivos ora tão sólidos e projetos tão românticos, quanto desafiadores, traições não esperadas e rompimentos de outras relações tudo causado pelas escolhas que fiz na luta política.

Humano que sou, eu dizia “não ter arrependimentos”, mas hoje não tenho condições de dizer isso. Seria hipócrita, mentiroso, egocêntrico, melhor aceitar que há sim escolhas e ações ruins na vida.

Para não deixar você, leitor e leitora, com mais curiosidades sobre os fatos, como se eu fizesse jogos mentais com vocês, posso revelar um arrependimento: minha decisão de ser candidato a vereador.

Das tarefas políticas que me prestei, essa é a única que gera profundo arrependimento.

Sei que o momento político e a conjuntura exigia a necessidade de assumir essa tarefa, estava no auge da militância, articulando e discutindo questões importantes, mais experiente e com condições mínimas. 

Mesmo atravessando a crise moral do PT de 2006, o que foi em frente era promissor. A experiência e vigor do chavismo na Venezuela, uma resistência político institucional que não virou mais um golpe de Estado promovida por Washington (EUA) mexia com alguns de nós.

E no PT, mesmo contrariando as estatísticas e a realidade institucional interna, o programa político do qual fazia parte, a esquerda do PT, ainda mexia com a militância inclusive do campo majoritário.

Sempre fui militante de tarefas difíceis. Fazendo um balanço das tarefas que assumi ou que minhas direções me designaram, a totalidade delas tem uma característica: nunca de destaque, mas intermediária, entre a articulação, organização e mobilização. Confesso que cumpri a totalidade de todas como um soldado.

E nem preciso dizer que a candidatura a vereador era uma diferença na curva, eu ficava mais exposto e à frente da tarefa.

Progressivamente, disputando espaço, fui candidato a presidente do PT municipal em 2008, e seguindo assim foram as tarefas que ocorreram: primeira derrota para vereador, depois fiz parte do governo municipal da minha cidade em 2009, fui secretário municipal da assistência, coordenador de juventude, em 2012 segunda tentativa e nova derrota para vereador e depois de algum tempo de novo na coordenadoria de juventude segui para o ostracismo entre 2014-2015. Como eu costumava dizer pra mim mesmo, depois desse período recuei as tropas para dentro do quartel.

De lá para cá preferi fazer comigo mesmo o que julgava ser melhor para lidar com os traumas, tentei resolver por conta própria. Não deu certo. Saúde mental é coisa séria, e mesmo a gente sendo militante, carregamos nossos preconceitos.

Guardei, guardei, remexi e explodi. Basta uma faísca perto da gasolina para gerar uma crise que se mostrou uma depressão. Não foi severa, porém, reveladora.

Se cuidar não é admitir fraqueza. O/a militante tem que assumir que não somos fortes, ainda mais se negamos ou combatemos esse sistema, no final tudo nos perturba, nos indigna, nos fere e ainda nos dá esse sentimento de estar acuado.

As primeiras consultas com psiquiatra foram angustiantes, contrariei os medicamentos, fiquei em negação diante da regulação dos sentimentos por meios psicotrópicos, me entreguei e segui. No atendimento psicológico descobri parte do que me angústia, diagnóstico preliminar: ansiedade. Sim ansiedade é doença mental e é séria.

Sempre gostei de planejar tudo, guardar tudo, organizar tudo, não faltar a reuniões ou compromissos, assumir tarefas e conclui-las, tudo estava encaixado no meu roteiro militante, contudo, parte disso se revela como uma ansiedade que se expressa de várias formas. Como disse, foda!

Progredi e conheci a homeopatia, muito bom e adequado a minha crença de não medicalizar a vida.

Paralelo a isso vem a interminável transição pelo que passo.

Um dia olhando para as inúmeras caixas acumuladas no meu escritório senti um insight que tomou meus pensamentos. Primeiro, o sentido de guardar aquilo tudo? Memória é fundamental, mas a que custo? Memória das lutas da classe trabalhadora que a própria classe não irá poder desfrutar, pesquisar ou descobrir? Mexer no passado e avaliar o que tem sentido ou não passou a ser minha tarefa pessoal. 

Tem sido muito bom e tem feito progressos. Essa ideia do minimalismo é interessante, o desapego as coisas deveria ser parte da concepção de vida de qualquer militante de esquerda, e foquei nisso. Parte doei, parte em processo de doação e parte joguei, joguei fora. Sentimento extraordinário.

Segundo, o sentido que damos a vida. Eu sou militante, depois de mais de duas décadas de uma vida dedicada a luta, não preciso de carteirinha ou diploma para atestar meus compromissos com a minha classe. Não estou dedicado como antes e nem assumi compromissos que não estão dentro dos valores que acredito. Reconheço que a falta de um coletivo, uma direção política faz falta, muita falta. 

As vezes bate um sentimento de inutilidade, acomodação.

Porém, sem estar bem, não dá pra fazer boa luta. Consigo lidar com a inquietação fazendo boas reflexões. Confesso que é um misto de trauma e falta de confiança, não quero de novo contribuir para projetos que se apresentam coletivos e depois seguem rodeadas de interesses contrárias as necessidades da classe, egos, disputas mesquinhas, guerra entre nós e não aos senhores.

Sigo contribuindo em outro ritmo. Não abandonei a luta, apenas estou me organizando e resistindo num tempo da reflexão, do estudo e da paciência revolucionária. Nas histórias das minhas referências, esses momentos centrais, como quando Lênin se manteve em exílio entre tantos e tantas de nós que não hibernou nas trevas, mas se resignou para poder seguir contribuindo para luta da nossa classe.

Do que não me arrependo? Da experiência vivida e das lembranças que eu guardo com carinho, em especial da primeira campanha para vereador, talvez isso no balanço seja extremamente positivo. 2008 ao reunir esforços para campanha recebi solidariedade de onde menos esperava, de dentro do PT o apoio de conhecidos da CNB (a corrente majoritária), de antigos militantes e amigos/as como Eduardo, Paulo e Neide, que foram incríveis ao ceder a casa onde era o comitê, outros companheiros que dedicaram o seu tempo como o tio Hélio, seu Donizete, colegas de outra cidades como Felipe, enfim, foi uma campanha carregada do idealismo que jamais deveria ter abandonado durante a aventura institucional. Nessa lista me cabe fazer um registro de um respeito que recebi e não esperava e que até o último segundo da tarefa institucional me foi leal, do ex-prefeito Sebastião Almeida, que confiou em mim mais do que alguns companheiros mais próximos de mim. A vida tem das suas contradições. Sinto falta dessa relação na política.

Hoje sei que fui injusto e abandonei ou esqueci de agradecer o esforço que foi em nome de uma causa. Esse é um erro pessoal que tento corrigir no exercício da luta política, a generosidade.

Bem, se você chegou até aqui, explico que esse texto neste blog é despretensioso, servindo mais para o autor do que para os leitores.

Como disse desde do início, a aventura institucional foi uma coleção de dissabores grande, olhar para trás é recordar também de lembranças ruins. Não imaginava que poderia usar os termos ex-amigos/as e ex-companheiros/as, mas é possível. Não sei o que se passa na cabeça destes, imagino hoje que eu nunca deveria de fato ter sido considerado amigo ou companheiro dessas pessoas. 

O sentimento é de ser visto como o “idealista otário”, alguém fácil de enganar. E leitor/a, como eu fui otário! Empenhado nas causas dispunha do bens materiais, com desprendimento e mesmo tendo como retorno apenas prejuízos, me reerguia. Era difícil para alguém perder a minha confiança. Ainda sou assim, porém mais cauteloso, cético, tenho medo do compromisso na política. Muita coisa me aconteceu.

Não sou santo nesse processo. Em nome da luta política fiz o que qualquer dirigente faria assumindo riscos. Hoje pago preço por isso. Ainda sendo temido por alguns, pois parece que o fato de eu estar vivo ou participar de algo fosse suficiente para gerar desconfiança. E mesmo na melhor das intenções, não tenho crédito nenhum, mesmo que eu verbalize a despretensão das minhas ações ainda assim sou um párea.

Antes solicitado para debates, hoje esquecido e ainda com a foto e o nome apagado da história, empurrado para total várzea da história. Nesse ponto, eu apenas tenho certeza que a escola me formou e me forjou me apropriou de qualidades que posso empreendera qualquer momento. Sou um leninista, um agitador, organizador e articulador de coletivos, isso é o que melhor sei fazer e disso não há dúvidas. Por isso, quando estiver bem, não tergiverso, cumpro tarefas e faço o que for necessário à luta de classes.

Então, pra quem acha que é moleza fazer essa travessia, essa transição, eu só posso dizer que as feridas da alma não se curam com medicamentos, curativos, palavras, ou qualquer coisa do tipo. Ideologia é coisa séria.

Ainda há algumas novas frustações, pena constatar que a sinceridade não faz parte do gesto na nossa esquerda. E mesmo assim eu incorro do mesmo erro, onde no final de 2020 para 2021 enviei cartas junto com materiais que imaginei estarem melhor guardados com seus destinatários e instituições. Mas até o momento nenhuma resposta. Isso abre a nova fase do meu desprendimento e minimalismo. Quanto mais me desprendo das coisas, mais me apego ao meu ser, a minha existência.

E por enquanto é isso leitores e leitoras corajosas mentes que deram seu tempo para esse desabafo.

Inicialmente era para ser uma reflexão das tarefas políticas frente a minha experiência na luta institucional, mas fica pra próxima.

Ainda no campo da esquerda espero uma absolvição pelas tarefas que cumpri e os erros que possa ter carregado, espero a redenção e espero ser redimido. Termino com a musica "Redimir" da Pitty, uma boa mensagem para os que entenderem!


Obrigado pela leitura!

Redimir (Pitty)

Se era pra sangrar, já sangrei
Se era pra perder, já perdi
Se era pra chorar, já chorei
O que mais falta pra me redimir?
Se era pra sangrar, já sangrei
Se era pra perder, já perdi
Se era pra chorar, já chorei
O que mais falta pra me redimir?
O chicote em minhas mãos
O chicote em minhas costas
Rasgando rios, o vergalhão
Via-crucis autoimposta
Ninguém me persegue melhor
Na cabeça, no corpo
Eu, meu próprio general
Prazer em te reconhecer, minha inquisição
Não encontrei ironia pra dizer
Mea culpa
Se era pra sangrar, já sangrei
Se era pra perder, já perdi
Se era pra chorar, já chorei
O que mais falta pra me redimir?
Se era pra sangrar, já sangrei
Se era pra perder, já perdi
Se era pra chorar, já chorei
O que mais falta pra me redimir?
O chicote em minhas mãos
O chicote em minhas costas
Rasgando rios, o vergalhão
Via-crucis autoimposta
Ninguém me persegue melhor
Na cabeça, no corpo
Eu, meu próprio general
Prazer em te reconhecer, minha inquisição
Não encontrei ironia pra dizer
Mea culpa
E ele que não bebia, bebeu
E ela que nem rezava, rezou
Quando o desalento desceu
Até a razão suplicou
Basta de tanto calabouço, é hora de alforria
Um novo tempo, que fora e dentro
Nos faça resgatar uma besta alegria
Se era pra sangrar, já sangrei
Se era pra perder, já perdi
Se era pra chorar, já chorei
O que mais falta pra me redimir?
Se era pra sangrar, já sangrei
Se era pra perder, já perdi
Se era pra chorar, já chorei
O que mais falta pra me redimir?
Se era pra sangrar, já sangrei
Se era pra perder, já perdi
Se era pra chorar, já chorei
O que mais falta pra me redimir?
Se era pra sangrar, já sangrei
Se era pra perder, já perdi
Se era pra chorar, já chorei
O que mais falta pra me redimir?
O que mais falta pra me redimir?
O que mais falta pra me redimir?
Fonte: LyricFind
Compositores: Priscilla Novaes Leone
https://www.youtube.com/watch?v=pX3kVzxWA4I




sexta-feira, 12 de março de 2021

Os que lutam toda vida são imprescindíveis! Com grande pesar, MST se despede de Joaquin Piñero

 Uma grande perda para classe trabalhadora! Kima era um companheiro que tinha paixão pela luta revolucionária, o conheci na Consulta Popular e depois nas lutas em parceria com o MST. Não nos falávamos muito, mas sempre que nos víamos nas lutas era acolhedor. Sua perda deixa a vida triste e nos deixa a certeza que seguimos, do luto a luta, Kima Presente!

Segue abaixo a nota do MST:

12 de março de 2021

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Joaquin iniciou sua militância no MST em São Paulo e dedicou mais de 20 anos de sua vida na luta pela terra. Foto: Arquivo MST

Os que lutam toda vida são imprescindíveis

 

Com grande pesar, MST se despede de Joaquin Piñero

 

 

É com grande pesar que nos despedimos do companheiro Valquimar Reis, nosso estimado Joaquin Piñero ou Kima, como era carinhosamente chamado pela militância Sem Terra. Joaquin faleceu na noite desta última quinta-feira (11/3), após complicações em seu estado de saúde.

 

Rondonense, flamenguista, iniciou sua militância no MST em São Paulo e dedicou mais de 20 anos de sua vida na luta pela terra, pela Reforma Agrária Popular e por uma sociedade mais justa para a classe trabalhadora. Atuou em diversos setores, estados e missões internacionalistas no MST.

 

Violeiro, poeta, sempre nos encantou com sua moda enluarada, e era um apaixonado pelo samba.

 

Desempenhou várias atividades dentro do MST, entre elas relacionadas as tarefas internacionalistas, sendo nosso representante na Articulação dos Movimentos Populares da ALBA, participando de inúmeros processos importantes na América Latina.

 

Em certa ocasião teve uma prisão injusta, que roubou muitos meses de sua vida. Mesmo assim não desanimou, era exemplo de persistência e otimismo. Joaquin organizou um cursinho supletivo na cadeia e passou a ser conhecido pelos presos como “Professor!”. Todos seus alunos na turma passaram.

 

Nos últimos anos de sua vida atuou no Rio de Janeiro, dedicado nas articulações em diversos setores da sociedade. Estudou Serviço Social na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) através de uma turma especial do Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (Pronera). Joaquin estava assentado no Irmã Dorothy, em Quatis, no interior do Rio.

 

A alegria, o companheirismo, o amor com a família e compromisso com a luta são algumas características de Joaquin. Sempre muito querido por todos ao seu redor foi um militante dedicado, movido por grandes sentimentos de amor, como nos legou Che Guevara.

Joaquin deixa duas filhas e uma companheira amada, as quais estendemos toda a nossa solidariedade neste momento de dor. A família Sem Terra perde um dos seus membros valorosos e reafirmamos o compromisso de nos mantermos na luta pela emancipação da classe trabalhadora.

 

O MST está de luto, mas honrará seu legado de militância e dedicação.

 

Rio de Janeiro, 12 de março de 2021
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra