A última grande emoção dos últimos anos com certeza é esse quarto mandato do PT e sua frente de coalizão governista que se mantêm no poder executivo federal ao completar um ciclo de 16 anos. Digo isso como petista, militante de esquerda e corinthiano, reunindo tudo que causa emoção ao coração temos, vivemos e sentimos os problemas do lado de cá (dos que venceram as eleições desde 2002 no plano federal) e do lado de lá que vive uma real abstinência de poder, levando ao ridículo dos discursos pró "golpe", "intervenção militar" e outras idiotices.
Dos problemas do lado de cá. Não podemos negar que o "new" desenvolvimentismo da ala majoritária promoveu avanços sociais ao ponto de elevar uma parcela da classe trabalhadora a uma condição de renda aceitável para o "mundo do consumo" e do crédito, até aí nada "cubano" ou "socialista", um tanto keynesiano com certeza.
Não podemos negar que foi um período de simbologias incríveis com a criação das secretarias especiais para mulheres, negrxs, juventude, etc., acompanhadas de suas legislações sociais (lei maria da penha, estatuto da igualdade, da juventude, etc..), e que agora como times titulares de um jogo sujo são rebaixados em nome da "moralização" do ajuste fiscal (já que a sua extinção ou incorporação em nada vai "poucar" os cofres públicos), e isso sim mexe mais com a militância. O que não estava ainda ideal, fica surreal para baixo.
Não podemos negar que as reformas estruturais sempre foram cogitadas no esteio dos projetos e programas como etapas - e se Lula não domina a literatura marxista, com certeza sabe aplicar bem - então antes da reforma agrária temos os programas que atendem o pequeno agricultor; antes da taxação das grandes fortunas o programa Bolsa Família - onde até o ex. sen. Suplicy bem lembra que é uma "etapa" para a distribuição de renda básica universal; antes da ampliação em ritmo das universidades públicas, o Prouni; antes da reforma urbana o "Minha casa, minha vida", tudo isso e muito mais, com a sua devida importância claro.
O pouco de apoio que recebeu o "andar de baixo" já é muito para buscar separar o abismo entre ricos e pobres.
Mesmo que a solução dessa aproximação seja ainda iludir os pobres sobre a fantasia do "trabalho duro" para se chegar ao "consumo ideal", uma babaquice que o capitalismo usa de discurso desde do sec. XIX para encobrir sua lógica da riqueza, a exploração de muitos por uma elite.
Porém, o lado de cá não tem a culpa de ter aceito a coalizão governista do PT, muito menos de ficar se martirizando sobre as questões do atual governo Dilma II e nem sobre o que é menos pior: defender ou não o governo?
O lado de cá também se beneficia da estrutura sindical varguista/facista quando aceita render-se ao imposto sindical sem de fato colocar na reta a retomada do sindicalismo combativo e coletivo. Quando é beneficiado pelo fundo público para seus projetos ou eventos de "caráter social".
De fato o lado de cá está dividido em vários lados, vamos ver pelos atos e pelas frentes, de esquerda, Brasil Popular, povo sem medo, etc., etc., uns pela democracia, outros pelo fim de tudo, tentando cada qual elevar-se sobre os exemplos de fora, tentando novamente "importar" a revolução ou a indignação.
Vejamos, o lado de cá tenta suas versões da "primavera árabe", do "podemos á brasileira", do "que se vayam todos", e assim vai. Nada de novo e por isso ainda não encontra-se resposta para o julho de 2013.
Enquanto houver a tentativa de agregar atacando, coagindo e reivindicando para si a verdade, ninguém vai avançar do lado de cá. Uns pela sobrevivência política e outros pelo oportunismo, ninguém vai capitalizar o possível "day after" pós PT. E nem sabemos se haverá algo pós PT ou que o PT será superado, há muita água (não em São Paulo) para passar por debaixo dessa ponte.
E o lado de lá?
Quem despreza o lado de lá, despreza a história! O lado de lá é a expressão dos efeitos de uma ditadura civil militar que fez de fato a coalizão da direita, do pensamento burguês brasileiro e que mantêm vivo a sua versão da história e o seu projeto político de poder. Aconselho assistir os três documentários de Silvio Tendler sobre Vargas, JK e Goulart e vamos entender que a tensão da sociedade brasileira por um projeto nacional alternativo ao capitalismo sempre foi sufocado de forma ideo-político e articulado durante a ditadura.
Vamos aos fatos desse processo: a reorganização e controle ideo-político das Forças Armadas, o sistema financeiro, a corrupção organizada (empreiteiras que o diga), o sistema de justiça, privilégios entre os poderes, acumulação indecente do capital (não que exista decente, mas aqui é demais), meios de comunicação...além de terem nos derrotado no processo da anistia e da constituição de 1988, somado a isso as reformas neoliberais da década de 1990.
E aí ficamos perguntando porque o lado de lá é forte? Como as pessoas podem pedir "volta da ditadura militar"?
Essa sociedade ainda é a reprodução do processo iniciado em 1964 e pouco fizemos para subverter. Não basta instrumentos participativos se indiretamente colaboramos para que sejam um fracasso. Qual foi a reforma estruturante que mexeu nos interesses da minoria que detêm o poder nesta sociedade brasileira pós redemocratização? Porque nossas conquistas estagnam no momento da sanção das leis sociais? Em que momento perdemos o controle do SUS, dos conselhos tutelares ou de qualquer outro instrumento legal que foi conquistado na luta social e popular?
Vivemos das migalhas do poder.
E o lado de lá é a bela combinação da hegemonia já nos apresentada pelo companheiro Gramsci, o consenso da massa dá a direita o direito de fazer o que quer.
Os problemas do lado de lá é o tempo que corroí a melhor das correntes. Pois há muitas narrativas, discursos e simbologias em disputa. Quando a água escasseia por conta desse modelo há perguntas. Quando há reações contra a discriminações persiste a renovação das relações sociais. Quando os juros aprisionam os assalariados há questionamento de sua legitimidade (legitimidade que só pode ser dada pelo Estado e pelo capital), ou seja, há mudanças de pensamento dispersas. Não podemos nos animar apenas com pequenas vitórias nas redes sociais virtuais, é preciso vencer nas reais.
E claro, o lado de lá não tem projeto de sociedade, porque já dirige a sociedade em submissão a classe dominante. Prefere ser capacho com algum padrão de consumo.
Então quando vejo combatentes valorosos que já estivemos de rosto colado afirmando aos cantos de qual lado devemos ficar penso que o melhor agora é defender a democracia e investir de fato no novo. Apontar que como indivíduos, ter ideais coletivos e um projeto de sociedade é importante e que isso não afeta a busca por melhores condições de vida, sabendo quem o inimigo e o adversário da classe, quem são nossos companheiros/as, enfim, ter ideais não interrompe a vida, a torna mais viva.
Tudo nesse momento é importante vindo do lado de cá. Tudo. Dando a oportunidade de que cada um precisa para se reencontrar.
Para mim, militante de esquerda e pequeno contribuinte dessas lutas, quero somar. Sem imposições, distorções ou verdades. Fazer parte é fundamental nesse momento.
Portanto não me sinto nem cúmplice e nem culpado pela situação em que estamos vivendo. Meu petismo sempre teve lado, não tenho vergonha da minha trajetória e faria tudo de novo.
Tenho certeza que votei em Dilma contra um mal maior para o país. Pode ter apenas retardado um processo inevitável ou conseguido tempo para retomarmos.
Daqui pra frente sei que meu voto é apenas um. Mas a minha militância faz diferença na relação que tenho com vários companheiros e companheiras.
Eu sei o caminho que escolhi. Vinte anos nisso e lutando para manter o socialismo vivo!