quinta-feira, 24 de setembro de 2015

“A esperança dança na corda-bamba, de sombrinha” - EDITORIAL DO JORNAL BRASIL DE FATO

PARA REFLETIR EM TEMPOS DIFÍCEIS
BOA LEITURA

EDITORIAL DO JORNAL BRASIL DE FATO

EDITORIAL
“A esperança dança na corda-bamba, de sombrinha”
Brasil de Fato
  Edição 655
                                                               14.09.2015                                                              

Já está anunciado que, em breve, teremos nos açougues e câmaras refrigeradas dos supermercados, muitas novidades para a temporada primavera-verão: alcatres de químicos, coxões moles de metalúrgicos, cupins de jornalistas, lombos de diagramadores e programadores visuais, miolos de professores, fígados de médicos, corações de enfermeiros, coxão duro de pedreiros, miúdos dos que recebem bolsa família, braços de pequenos camponeses e assalariados rurais, maminhas de servidores públicos, costelinhas de menores trabalhadores, moelas de arquitetos e engenheiros, ossobuco de fotógrafos e cinegrafistas, tutanos de tecelões, filé mignon de carpinteiros e marceneiros, pontas-de-agulha de costureiras e alfaiates, toucinhos de coureiros, línguas de advogados, carne-seca de diaristas, além de bem-casados de periguetes, etc.
Não se tratará, no entanto, de uma volta à antropofagia ritual tupi, nem à feijoada com que Mário de Andrade encerra o seu “Macunaíma” – apesar de abundarem na praça tantos heróis sem nenhum caráter.
É que, simplesmente, já prometeram mais uma vez, que vão “cortar na carne”.
(A essa altura, os “coxinhas” estarão vibrando, cada vez mais cevados e gordinhos).
No Brasil (a antiga Pindorama posterior ao desencontro dos seus povos originais com os europeus do mercantilismo), “cortar na carne” sempre significou congelamento salarial, novas taxas e impostos, demissões em massa de trabalhadores, e um encolhimento cada vez maior dos serviços que o Estado teria por obrigação disponibilizar para a população, sobretudo (ainda que não apenas) para aqueles cidadãos de baixa renda. Para estes últimos, os investimentos até que são grandes e polpudos nas esferas estadual e municipal, para a construção de pontes, viadutos, passarelas e marquises. “Minha Ponte, Minha Vida” é hoje um dos programas habitacionais com maior investimento entre governadores e prefeitos.
                                                                       
Mas, voltemos à esfera federal.
Embora nos oponhamos radicalmente a qualquer tipo de golpe contra as nossas instituições – ou seja, embora defendamos radicalmente o cumprimento do mandato da presidenta Dilma Rousseff –, por uma questão de defesa incondicional do Estado Democrático de Direito, conquistado depois de muitas lutas dos trabalhadores e dos segmentos populares (muitos pagaram com a própria vida), entendemos que, sobretudo depois do “acordão” celebrado com banqueiros, grande capital internacional, Partido dos Trabalhadores e Instituto Lula, há um grande giro (para a direita) do atual Governo. As medidas anunciadas e previstas pelo Planalto, além de agravar a situação da classe trabalhadora e do povo (povo = todos os explorados e oprimidos), retira qualquer ônus das classes dominantes e das elites, criando-lhes novos privilégios, e eximindo-as das responsabilidades por uma crise resultante das suas próprias políticas de ganância.
Ora, há um raciocínio que subjaz às decisões da presidenta Dilma que, no entanto, nos escapa: como, depois de perder importantes fatias das bases de governabilidade no Congresso; depois de ter o Partido dos Trabalhadores rachado em torno do seu mandato, ela aceita acordos que necessariamente a farão perder o apoio dos movimentos e organizações de trabalhadores e do povo? A qual tipo de chantagem estarão sujeitos ela e/ou seu partido para, de repente, entregarem anéis e dedos? Enfim, sobre uma reunião a portas fechadas – e da qual só temos (sofremos) os efeitos – permite que se possa pensar qualquer coisa e especular o que bem entender.
Isto – por si só – é profundamente preocupante, sobretudo se lembramos que a nossa presidenta é uma mulher inteligente, dona de grande cultura e experiência política e, desde sempre, comprometida com os interesses da classe trabalhadora e do povo.
Mais preocupante ainda, quando sabemos que existem vários projetos em curso no Congresso, que atentam contra a nossa soberania, como o do senador tucano José Serra sobre a entrega do Pré-Sal a empresas estadunidenses, implicando a privatização do nosso Monopólio Estatal do Petróleo – a Petrobras, para não falarmos dagrita da direita sobre o BNDES e outras tantas empresas públicas.
A falta de clareza do que está acontecendo de fato – onde se mesclam questões de Estado e questões de Governo – poderá levar alguns setores mais radicalizados das organizações e movimentos de trabalhadores e do povo, bem como partidos e agrupamentos de esquerda, a apostarem na queda da presidenta – engrossando o coro da direita, ultradireita e social-oportunistas. E aí, teremos algo como a queda do muro de Berlim e da União Soviética, derrubados pela direita, sob os aplausos de muitos setores da esquerda. Deu no que deu.
 
Se isto acontecer com a presidenta, estaremos em pleno caos. Legal ou ilegalmente, quem a substituirá? “Estadistas” da envergadura do deputado legalista Eduardo Cunha? O carreirista e Aspirante Aécio Neves? O vice-presidente Michel Temer? O grande intelectual FHC – que hoje é reprovado até em exame de DNA? A senadora Marina Silva – a Nefertite de Igarapé? O probo e ilibado senador Renan Calheiros? Fernandinho Beira-Mar? A Opus Dei, com o seu Geraldo Alckmin? O bravo combatente contra o aborto, senador José Serra?
Enfim, são esses os quadros da política brasileira.
Enfim, este é o quadro da política brasileira.