quarta-feira, 5 de abril de 2017

O conflito na Venezuela: quem está dando golpes?

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O conflito na Venezuela: quem está dando golpes?
          
         1.O que de fato está acontecendo na Venezuela?
Essa é a primeira pergunta que todos nós, que desejamos e lutamos por um América Latina livre e soberana devíamos fazer antes de reproduzir notícias falsas fabricadas nas redações da mesma mídia golpista que derrubou o governo eleito democraticamente no Brasil.
            A morte de Hugo Chávez ,a crise internacional capitalista e a queda no preço do petroleo,fizeram com que a complexa situação economica da Venezuela entrasse em um novo patamar de dificuldades. A direita venezuelana colocou em marcha uma nova estratégia para derrubada do governo, pois a tentativa fracassada de golpe clássico em 2002 – uso de setores das forças armadas e sequestro do presidente – lhe impôs uma década de derrotas. A atual estratégia é a mesmo aplicada no Paraguai em 2012 e no Brasil em 2016, porém com intensidade correspondente ao conflito do país: utilizar as vias legais para dar o verniz democrático ao golpe parlamentar.  E a tática para chegar a esse objetivo se parece mais ao que a CIA fez contra o governo Allende em 1973 no Chile: guerra economica, inflação provocada e estoque de produtos de impacto psico-social.
 
2.A crise econômica internacional - que provocou a queda brutal nos preços do barril de petróleo (de 125 dólares em 2012 para os atuais 50 dolares ) – impôs a Venezuela, quarta maior produtora de petróleo do mundo, mudanças econômicas profundas. Assim como a maior parte dos países do mundo, ela viu sua economia perder recursos e, com isso, seus programas e medidas que beneficiavam o povo  passaram a enfrentar grandes dificuldades. Some-se ao contexto macro-economico adverso, de uma economia ainda totalmente dependente do petroleo e do abastecimento do exterior-  que não houve tempo historico suficiente para reindustrializar a economia do país e gerar empregos na produção.   Estas dificuldades foram muito bem utilizadas pela burguesia sempre na oposição- e ainda acrescentaram a especulação permanente com a moeda do dolar.  Atraves da manipulação da taxa de cambio no paralelo e usando as divisas fornecidas pelo proprio governo, a burguesia compradora induziu taxas incontrolaveis da inflação em bolivares (moeda local).   Por outro lado, organizou uma guerra comercial ao controlar e esconder produtos de consumo de massa, que tem forte impacto psico-social, como: esconder papel higienico, pasta de dente,  oleo de cozinha, ou farinha de trigo para pão salgado que tem preço controlado, etc    Esperavam com isso criar uma situação de ingovernabilidade e  o caos,  através da guerra econômica  que pudesse desmoralizar o governo Maduro e levar a novas eleições.
Neste contexto, obtiveram a primeira vitoria eleitoral ao eleger a maioria no Parlamento nas eleições de 2015.
 
3.De lá para cá, praticamente todas a medidas de recuperação econômica enviadas pelo poder executivo ao congresso foram automaticamente rejeitadas e, assim, aprofundam e atrasam qualquer possibilidade de recuperação da economia gerando enormes sacrifícios ao povo venezuelano. A escalada do conflito obrigou então o governo a adotar uma série de medidas legais para continuar governando o país mesmo com a declarada sabotagem do parlamento.
Porem, na disputa politica com as massas e na tentativa de derrotar o governo Maduro, a oposição burguesa não teve sucesso.    Primeiro estão divididos entre eles.  Os setores de direita mais radicais querem aumentar os conflitos para inviabilizar o governo.  E os setores mais moderados, liderados por Capriles, querem desgastar o governo para colher os votos em 2019, dando maior legitimidade ao novo governo, e esperando que o petroleo até lá, se recupere.   Segundo: Manipularam grosseiramente as assinaturas para convocar um referendum, e isso os desmoralizou.   Terceiro: não conseguiram dar seriedade e fazer funcionar a assembleia legislativa.   Tinham tres deputados eleitos fraudulentamente e suas disputas internas inviabilizou o funcionamento da assembleia durante todo ano.   E quarto, a denuncia de propina da empresa brasileira Odebrecht para o principal lider oposicionista senhor Capriles, que recebeu  5 milhões, os deixaram envergonhados perante a opinião publica.
De parte do governo e das forças populares, apesar de todas dificuldades economicas, reconhecidas e debatidas todos os dias na imprensa popular, o governo teve a humildade de debater sempre com a população e  a convocá-la a se mobilizar.    Nunca houve tantas passeataa e mobilizações como nos ultimos dois anos.
 
            4.  Uma nova escalada do conflito teve início em 9 de janeiro de 2107, quando a Assembleia venezuelana simplesmente decidiu não reconhecer o presidente eleito como chefe da nação. Alguém viu a mesma gritaria como agora? Alguém viu a palavra “golpe” ser usada nesse caso? Não, nenhuma palavra sobre uma Assembleia que simplesmente resolveu destituir o presidente eleito, rompendo com a constituição daquele país. Diante disso, uma série de leis especiais foram promulgados pelo governo, visto que agora a Assembleia não somente faz oposição e sabotagem mas, também,  desconhece legalmente o presidente. A partir de então, o conflito entre poderes passa a ser um fator constante e o TSJ – Tribunal Supremo de Justiça -, equivalente ao STF no Brasil, passou a atuar para a sua resolução.
           
            5.O que de fato ocorreu na última semana?
            Não foi, nem de perto, um “autogolpe” como saíram às pressas a proclamar nas redações da mídia golpista. O TSJ já havia solicitado que a Assembleia não nomeasse três deputados eleitos pelo Estado do Amazonas que, comprovadamente, cometeram crimes eleitorais (imaginem se o STF resolve de fato atuar aqui nessas questões...) e que, portanto, não deveriam ser empossados. Por se tratarem de três opositores ao governo a Assembleia descumpriu a ordem do TSJ (lembram do caso Renan e STF?) e, dessa forma, o TSJ considerou a Assembleia incapaz de cumprir suas funções e assumiu o controle dessas.
Em nenhum momento o parlamento foi fechado ou dissolvido, muito menos a pedido do executivo. Portanto, em nenhum momento se descumpriu a constituição e a lei e nenhuma ditadura foi implantada. Isso tudo só existiu na bem articulada rede golpista que, através de suas mídias, rapidamente divulgou uma avalanche de mentiras e cenas de um golpe que nunca existiu. O governo de Nicolas Maduro atuou inclusive para restabelecer a ordem, pois acatou a interpretação de inconstitucionalidade proferida pela procuradora-geral e, através do Conselho de Defesa do país (órgão previsto na constituição venezuelana) solicitou ao TSJ que revisse a decisão e devolvesse o poder da Assembleia aos parlamentares.
Alie-se a esse contexto local, as artimanhas na OEA, em que o seu presidente, um embaixador indicado pelo Uruguai, sr. Almagro, passou a atuar claramente de acordo com as orientações do governo dos Estados Unidos.   Colocou em votação um voto de punição da Venezuela.  Precisava de 24 paises apoiando a propositura, conseguiu só 19 dos 34 membros.    A OEA voltou a ser um bastião colonizador dos interesses dos Estados Unidos.  Nenhuma deliberação sobre as prisões ilegais de Guantanamo, as colonias de Porto Rico, Guiana Francesa, Belize e Malvinas.   Nenhuma palavra  sobre os problemas no Paraguai, Colombia, Peru, Brasil  ou sobre a saida ao mar- direito histórico da Bolivia...
           
          6.Portanto, estamos diante de uma articulação internacional (mídia, poder judiciário, grandes empresas locais e interesses do imperio dos Estados Unidos) que já derrubou tres governos legítimos na América Latina nos ultimos anos, utilizando-se  de  métodos semelhantes. É mais uma tentativa de golpe por parte da direita venezuelana via parlamento e a grande mídia continental - que conta agora com o apoio do governo golpista brasileiro que reuniu às pressas o Mercosul para expulsar e isolar a Venezuela.   Mas não fez nada para impedir novo golpe no Paraguai em que o Presidente quer impor a reeleição, proibida pela constituição.
Felizmente a Venezuela conta com um  poder Judiciário democrático que não se acovarda , nem se rende diante dos golpistas, como aconteceu  no Brasil ou mesmo nos Estados Unidos na eleição do Bush.
           
         7.  Devemos ter consciencia e acompanhar com atenção as dificuldades de um processo que quer construir uma sociedade igualitaria, mas enfrenta  as atrofias de um estado burgues e burocratico dominado por uma pequena burguesia acostumada com as propinas do Petroleo.  Uma economia dependente e não industrializada, que ainda não consegue ter no trabalho produtivo seu pilar principal.  
Um processo de construção democratica, que  propoe  maior participação popular, em todos os niveis, mas se depara tambem com as tradições eleitorais do passado.
Sabemos que há vontade politica dos dirigentes do processo de  estimular cada vez mais o protagonismo da mobilização e organização popular, unica forma de superar os dilemas historicos da luta de classes.
             É dever nosso, defender esse projeto de soberania popular, que luta bravamente em meio à crise e problemas internos, que são manipulados pelos inimigos que desejam a volta ao modelo servil e de exploração que reinava na Venezuela, para que a renda petroleira seja apropriada apenas por uma minoria capitalista.  Certamente se a Venezuela não fosse o quarto maior produtor e exportador mundial de petroleo, não estaria passando por essa situação.
             Denunciar essa rede de mentiras é nossa tarefa, contribuindo  para manter um presidente eleito democraticamente, de um país símbolo de soberania, diante da ofensiva do imperialismo e defender as  conquistas obtidas pelo o povo. 

Articulação dos movimentos populares hacia ALBA-  Brasil
 

Sao Paulo, 5 de abril 2017